POR QUE DEVEMOS LEMBRAR SENNA?
Relato de Renan Santos.....
Nasci em 1984, ano em que Senna estreou na Fórmula 1. Quando me dei como gente, aos 4 anos, ele já era herói nacional. Lembro, aos 6, que confundia a figura de Senna com a de Jaspion; na minha cabeça, ambos ocupavam o arquétipo de guerreiro invencível, que sempre triunfava ao final do episódio. Aos 8 e 9, assisti Senna ser derrotado sistematicamente pelas “Williams de outro mundo” de Mansell e Prost. Não me importava. Mesmo em condições adversas, ele sempre provava ser o melhor dentre todos. Era o suficiente para mim.
Aos 10, vi Senna morrer. Não fazia sentido. O único herói que tinha visto morrer anteriormente fora o Black Kamen Rider – cuja ressurreição e vingança foram negados a minha geração pois a Manchete não comprou o último episódio. De qualquer forma, Senna simplesmente não poderia morrer. Simples assim.
Ayrton Senna da Silva foi o único herói brasileiro. E quando falo herói, não me refiro apenas a feitos heróicos. Sei que nossa história é cheia de homens e mulheres, anônimos ou não, que realizaram coisas extraordinárias. Mas me refiro a algo diferente. Senna era, antes de tudo, um mito. E enquanto mito, encarnava um arquétipo – o arquétipo de Aquiles – que jamais fora concedido aos brasileiros em 500 anos de história. Nos negaram isso – seja pela falta de um imaginário nacional realmente virtuoso, seja pela imposição de uma cultura rasteira e indolente. Ninguém quer ser Macunaíma, o “herói sem virtudes”. Essa figura é um lixo. É um vilão.
Ser garoto no Brasil é um saco. Nossos heróis são todos americanos e japoneses. Nossas figuras públicas não inspiram ninguém. Não existe um panteão de heróis virtuosos para quem nossos jovens possam se identificar e construir sua persona brasiliana . Lembram-se do fenômeno Capitão Nascimento? Crianças queriam ser o soldado do Bope. Mas Padilha matou o herói antes que o mesmo pudesse se enraizar em nosso imaginário. Pena.
Ao final, nos restou o deserto moral. Aprendemos desde cedo que levamos vantagem em tudo; somos espertos, ligeiros e malandros. Como Pelé, Lula e Macunaíma.
Mas minha geração teve Senna. E Senna inspirou muita gente. Quando estudava para o vestibular, era na ética de trabalho de Senna que me baseava. Quando me negava a desistir de algo, era em suas histórias de superação que me apegava. E sei que muita gente também fez isso.
Não fico surpreso que a geração que viu Senna correr é, justamente, a geração que derrubou o PT. A guerra política que presenciamos colocou frente a frente o Brasil de Senna – trabalhador, virtuoso e obstinado -, e o Brasil de Macunaíma – malandro, dissimulado e rasteiro. As figuras públicas que encarnavam cada movimento – Moro, Kim e Janaína de um lado, e Lula, Dilma e Cardoso de outro, demonstram isso. De certa maneira, havia muito de Senna em nossos representantes, assim como muito de Macunaíma em nossos antagonistas.
E é assim que as coisas devem ser. Sabemos que um novo Brasil nasce quando assistimos o ocaso de uma mitologia fajuta e amoral e o nascimento de um referencial comum virtuoso e positivo. Sérgio Moro, a “República de Curitiba”, as canções da Banda Loka, a “Marcha pela Liberdade”, as lágrimas de Janaína, o acampamento em Brasília, as ruas tomadas por gente que “veio de graça”. Tudo isso é sinal de um país que mudou. Ainda bem.
Espero, honestamente, que esse imaginário se imponha.
Que o novo Brasil seja,
cada vez mais,
o Brasil de Ayrton Senna
do Brasil.
Créditos: Movimento Brasil Livre
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